4 - A ideía


O fantasma da folha em branco vem assolar todos nós, escritores e roteiristas. A abertura do filme JOGUE A MAMÃE DO TREM tem uma seqüência primorosa de um escritor com a síndrome da folha em branco. Sentado à frente de sua máquina de escrever o pobre homem sofre um bocado sem conseguir uma frase que preste para começar seu novo romance. Folhas e mais folhas são tiradas da maquina, violentamente amassadas e jogadas ao lixo.
Como o filme é um pouco antigo hoje em dia o escritor estaria na frente da tela em branco do Word...

De onde vem a idéia? Como e quando um roteiro realmente começa?
Eu tenho 2 processos de criação. Estando sempre atento a observar o mundo e tentar entende-lo nesse processo aparecem boas idéias. Uma notícia num jornal, uma observação feita acerca de determinada situação, um tema que me pareceu pouco (ou erroneamente) explorado pela mídia, tudo isso me fornecem idéias.
Esse primeiro processo é muito mais cerebral, fruto de usar a observação aliada ao talento. Depende de você estar conscientemente atento e fazer um trabalho que parte muitas vezes do racional para o emocional.
Mas existe um segundo processo que é mais, digamos assim, mágico, um tanto quanto incontrolável e imprevisível: a inspiração. Você não pode prever quando ela vem nem força-la a vir. Mas quando ela vem ela vem com tudo.
De estalo, aparentemente do nada, tenho uma idéia. Ao invés de deixa-la passar, de espanta-la como se espanta uma mariposa que voa em volta da nossa cabeça eu a deixo voar. Deixo a idéia evoluir na frente dos meus olhos pra ver até onde vai dar.

Daí o roteiro me aparece quase pronto. Seqüências inteiras estão ali, diante dos meus olhos, numa velocidade vertiginosa. E é preciso anotar tudo nessa hora - porque depois vai ser tarde demais. Porque isso é um processo emocional e a parte racional agora estragaria tudo.

Nessas horas o negócio é anotar com o máximo de detalhes possíveis a idéia e se lançar ao roteiro o quanto antes. Porque depois o tempo vai passando, as cores da idéia vão se desbotando, e o que poderia ser o roteiro do ano pode acabar com mais um pedaço de papel amassado no fundo da gaveta.
Para esses momentos mágicos recomendo estar sempre com caneta e um bloco de anotações à mão. Afinal você nunca sabe onde vai ter uma idéia: pode ser no serviço, no ônibus, no carro enquanto você dirige (esse é o pior dos momentos), enfim em qualquer lugar.

Muitas vezes um pensamento se encadeia com outro, que não tinha nada a ver com o primeiro nem com onde eu estava, e de repente se abre a janela da mente e voa a idéia fazendo suas evoluções magníficas. Outras vezes um fato acontecido ali na minha frente liberta a idéia - que no fim não vai ter nada ou pouco a ver com o fato que a originou.

Muita gente fica esperando a vida toda por esses momentos mágicos que ou não vem ou quando vêm não podem ser aproveitados. Então meu conselho como roteirista é: trabalhe. Não espere a idéia pintada de dourado na sua frente. Porque no fim as idéias nascem mesmo das nossas observações. E observar ajuda muito a inspiração.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Os comentários passam pela moderação antes de serem publicados.